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Os seis hábitos das pessoas compassivas

October 7, 2019 3:06 pm    Back to Home

 

Por Hooria Jazaieri

Colocando o amor em ação

Vocês se descreveria como uma pessoa compassiva?

Mesmo que a resposta para a pergunta acima seja negativa, eu aposto que, pelo menos às vezes, você é compassivo(a) (ex. quando esté bem disposto e sem pressa), ou com algumas pessoas do seu convívio (ex. com seus amigos mais próximos). Podemos pensar na compaixão como um estado mental ou uma atitude em relação ao sofrimento (o seu ou o de outros) que incluí quatro componentes:

  • Tomar consciência da existência do sofrimento (aspecto cognitivo)
  • Ser emocionalmente movido pelo sofrimento (aspecto afetivo)
  • Desejar que exista um fim para o sofrimento (aspecto intencional)
  • Disposição para agir no sentido de eliminar o sofrimento (aspecto motivacional)

Ao contrário do que muitos acreditam, a compaixão pode ser comparada à um músculo que, como qualquer outro, pode ser fortalecido com exercícios apropriados – ou então, pode deteriorar e atrofiar-se na ausência de tais exercícios. Em outras palavras, sua potencial para compaixão pode ser expandido, se assim quiser.

Na escola, provavelmente, não lhe ensinaram que é possível fortalcer qualidades interiores, como a compaixão, de forma intencional. A boa notícia é que existe um conjunto específico de hábitos que podem te ajudar a expandir sua autocompaixão e a compaixão pelo próximo.

Primeiro Hábito – Experimente as práticas de compaixão testadas através de pesquisa científica

Pesquisas preliminares de uma variedade de testes controlados aleatórios sugere que a compaixão pode, de fato, ser fortalecida através de programas sistemáticos de treinamento. Por exemplo, o curso de treinamento do cultivo da compaixão em oito semanas (CCT) desenvolvido por Thubten Jinpa e seus colegas da Universidade de Stanford, sugere que adultos podem aumentar sua autocompaixão, tornando-se mais inclinados à prática da autocompaixão e compaixão pelo próximo.

Mesmo que não tenha a oportunidade de participar de um programa de treinamento cientificamente validado como esse citado acima, existem diversas formas de fortalecer o “músculo da compaixão” – muitas das quais estão descritas no website Greater Good In Action (GGIA), biblioteca online desenvolvida pela Universidade de Berkeley que disponibiliza práticas validadas pela ciência. Algumas dessas práticas envolvem técnicas de meditação, tal como a prática da bondade amorosa. Há ainda exercícios de escrita, um deles pede que o participante descreva um momento em que se sentiu profundamente conectado com outra pessoa.

A maior parte das práticas recomendadas pelo GGIA e também pelos programas estruturados, tem a mesma duração média, De 10 à 30 minutos. Assim como em outras modalidades, quanto mais praticamos os exercícios, mais chances teremos de colher os benefícios. Porém, sabemos que um é melhor do que nenhum. Por exemplo, se sua meta de exercícios físicos é de 10.000 passos por dia, mas você só conseguiu atingir um terço dela, esse quadro é ainda é melhor para sua saúde do que não ter dado nenhum passo, certo? A meditação funciona de forma semelhante. Enquanto podemos estabelecer a meta de meditar sobre bondade amorosa por 20 ou 30 minutos diariamente, menos é, certamente, melhor do que nada – mantendo uma prática regular, ainda que abaixo da meta, você estará mantendo sua intenção e rotina, fatores que aumentarão as chances de a meta ser cumprida no futuro.

Segundo hábio: Práticas de Compaixão Informais

Enquanto a ciência avança no sentido de validar tais práticas de cultivo da compaixão, também devemos abrir espaço para práticas informais, aquelas realizadas no aqui e agora, de maneira continuada durante nosso dia-a-dia.

Um exemplo de prática informal seria atentar-se aos momentos em que a compaixão surge de forma livre e espontânea dentro de você, ao longo do dia (por exemplo, enquanto assiste o telejornal). Você pode também atentar-se aos momentos em que resiste reconhecer e aceitar a presença do sofrimento (o seu próprio ou o dos outros. Por exemplo, quando passamos por alguém pedindo esmolas na rua ou na relação com um membro da família com quem temos diferenças). Durante o dia, você pode ainda atentar-se às vezes que julga ou minimiza o sofrimento (por exemplo, quando dizemos que algo não conta como sofrimento ou que é insignificante quando comparado ao sofrimento de outros). Estamos constantemente atentos ao sofrimento (o nosso e o dos outros), mas rapidamente negamos tais pensamentos e dessa forma nos tornamos indiferentes diante da dor (estado que constitui o segundo componente da compaixão). Essa tomada de consciência sobre a presença ou ausência da compaixão pode nos fornecer informações valiosas sobre nossos estados mentais.

Portanto, da próxima vez que estiver na fila do supermercado, ao invés de ficar mexendo no celular ou mesmo checando o quão rápido as outras filas andam (na maior parte das vezes, somos culpados das duas infrações!), pare para considerar os esforços conjuntos que possibilitaram sua ida ao supermercado – desde as pessoas que cultivaram os alimentos alí comercializados, passando por aquelas que transportaram os alimentos, até a pessoa operando o caixa que vai te atender. Talvez, a partir dessa consideração, você possa tomar um momento para desenvolver apreço por cada uma das pessoas envolvidas nesse processo. Se você achar adequado, pode usar essa oportunidade para reconhecer a interdependência que nos cerca. Nossas vidas, mesmo durante idas banais ao supermercado, são amparadas por incontáveis outros seres.

Terceiro hábito: Estabelecendo uma intenção

O renomado professor de meditação Jack Kornfield, diz que estabelecer uma intenção é como ajustar a bússola do coração. Uma intenção clara é capaz de orientar nossos esforços no sentido da compaixão. Ela ainda nos ajudará a recordar constantemente porque escolhemos dedicar nosso tempo ao cultivo da compaixão. Ao ensinar compaixão, costumo propor aos alunos as seguintes reflexões:

  • O que te traz à prática hoje?
  • O que você veio buscar aqui?
  • O que quer para sua vida?
  • O que você tem para oferecer ao mundo?

Embora essas sejam “grandes” indagações, elas podem nos ajudar a refletir sobre nossas intenções no sentido do fortalecimento da compaixão.

No início da semana, tente estabelecer uma intenção antes de começar sua prática meditativa de compaixão e observe se essa intenção te ajuda a esclarecer seu propósito. As vezes, essa intenção pode reaparecer de repente como um sinal de renovação do seu compromisso com a prática da compaixão, mesmo quando não estiver sentado na almofada de meditação.

 Quarto hábito: Colete seus próprios dados

A pesquisa científica é probabilística. O fato de algo funcionar para a maioria (ou para um grupo de aplicação), não significa que também funcionará para você. Nesse sentido, costumo lembrar meus alunos que para obter os dados mais precisos é preciso que sejamos “nossos próprios laboratórios”.

Faça um experimento curto, talvez por algumas semana ou meses, e recolha seus próprios dados. Você tem se sentido mais compassivo (em relação a você mesmo, pessoas amadas, estranhos e inimigos) ao utilizar práticas formais (meditação sentada) e informais (recitar silenciosamente versos de bondade amorosa para você mesmo enquanto espera na fila do mercadinho) para o cultivo da compaixão?

Meus alunos do curso de treino da compaixão recebem um livro de exercícios que contém um diário de prática com espaço para comentários. Já que as práticas são diferentes a cada dia, é importante dedicar tempo ao ato de refletir, ainda que alguns poucos minutos, sobre como me sinto em relação à elas: o que emergiu em minha mente, para onde minha atenção foi durante a prática, como nossa intenção tem guiado nossa prática, e por aí vai. Sem reflexão, tais prática acabam se tornando mais um item de uma longa lista de “coisas à fazer”. É apenas através da reflexão que poderemos avaliar se essas práticas podem realmente nos beneficiar (a curto ou longo prazo).

Além disso, eu recomendo que os alunos marquem um “0” na lacuna referente ao tempo de prática em seus diários, caso não tenham conseguido realizar a prática prescrita. Peço ainda que nesse item descrevam o que fizeram no lugar da prática (por exemplo, fiquei preso respondendo e-mails; acordei tarde; fui à academia; assisti TV e etc.). Esse tipo de hábito nos permite cultivar uma rotina que compreende o registro e a relfexão sobre nossas práticas diárias. Também nos ajuda a examinar os padrões de comportamento presentes nos dias em que não praticamos – talvez estejamos escolhendo fazer coisas que que são prioritárias quando comparadas a meditação, ou talvez estejamos negligenciando nossas vidas.

Quinto hábito: Busque ajuda

De acordo com minha própria experiência como estudante e professora de meditação, é importante ter a orientação de um instrutor quando adentramos na prática. O instrutor poderá tirar dúvidas, facilitar no processo de resolução de conflitos que possam surgir durante o processo e, principalmente, te ajudar a desenvolver disciplina e persistência na prática.

Uma das coisas que mais gosto sobre ensinar compaixão é o ambiente acolhedor que é naturalmente gerado no seio do grupo de praticantes – trata-se da oportunidade única para experimentarmos  uma prática comunitária. Além disso, acredito que essa experiência coletiva nos ajuda a renovar nosso otimismo pois nos faz lembrar que não estamos sozinhos na jornada. Muitos outros também estão no processo de reconhecer e diminuir o sofrimento no mundo. Essa importante noção pode muitas vezes se perder quando praticamos em isolamento.

Caso você não tenha o tempo ou dinheiro para uma aula, não se preocupe. Você sempre pode procurar o apoio de um centro religioso que conduza práticas meditativas gratuitas. Caso não encontre um desses na sua região, tente recrutar um aliado, algum parente ou amigo que possa, de maneira aberta e sem julgamentos, te encorajar no sentido da prática naqueles momentos que não se sente muito compassivo em meio ao sofrimento.

Sexto hábito: Esteja aberto às possibilidades (Seja compassivo com você mesmo)

Mesmo quando temos uma intenção clara para praticar, existem diversas condições que nos levam a deixar a peteca cair. Frequentemente, o que as pessoas fazem quando isso acontece é praticar a autocrítica. Pensamos coisas como “Eu nunca persisto em nada”; “Sou um fracasso”; ou “Eu não consigo fazer isso!” Controversamente, não existe nenhuma evidência empírica que comprove a eficácia desse tipo de abordagem para melhorar nossa disciplina. Na verdade, existem dados que sugerem o oposto, que o elemento da autocrítica pode nos distanciar dos nossos objetivos, ao invés de nos aproximar deles.

Ademais, uma oportunidade interessante que emerge quando deixamos nossa meditação na compaixão de lado, é justamente a prática da autocompaixão. Ter compaixão quando falhamos em nossa prática da compaixão é um excelente “teste”. Quando nos sentimos propensos a desenvolver uma postura severa, crítica e dura em relação a nós mesmos, será que conseguimos, ao invés disso, escolher a compaixão, ou reconhecer nosso sofrimento notando como ele nos faz humanos, ou ainda notar que não estamos sozinhos experimentando essa dor, tentando ser gentis com nós mesmo (ou pelo menos tentando evitar comportamento autodestrutivo – “Se não tem nada de bom a dizer, então não diga nada”)?

Frequentemente, ouvimos dizer que a meditação deve ser “relaxante”, “alivando o estresse”, e “prazeirosa”. Apesar de todas essas sensações serem possíveis desdobramentos da prática, para muitos, a experiência com meditação ou práticas de cultivo da compaixão é o oposto de relaxante, positivo e tranquilo. Algumas pessoas, dependendo do tipo de prática, podem desenvolver extrema ansiedade apenas ao tentar focar na respiação. Lembrar dos nossos entes queridos pode trazer nostalgia ou luto. Imaginar-se como uma criança pode trazer dores e tristezas do passado. Reconhecer o sofrimento alheio pode trazer culpa e opressão.

É importante notar se estamos sobrecarregando nossa prática de compaixão com alguma expectativa. Muitas vezes, as pessoas dizem que as práticas de compaixão “não estão funcionando”. Ao investigar a experiência dessas pessoas, percebemos que elas normalmente se referem à incapacidade de se sentirem relaxadas depois da meditação. Por mais que o alívio do estresse e o relaxamento sejam os objetivos para alguns tipos de meditação, em geral, esse não é o caso quando falamos de meditação na compaixão. Em última instâcia, compaixão está intimamente relacionada ao sofrimento, que pode ser um difícil objeto de meditação.

Existem ainda pessoas que relatam expectativas de linearidade nas sensações provocadas pela meditação na compaixão. Elas esperam que, por terem sentido determinada sensação ontem, essa mesma sensação se manifeste novamente hoje. Conforme tenho ensinado meus alunos, a realidade está constantemente em transformação. (enquanto você está lendo este artigo, o tempo está passando e a terra girando), portanto é uma certa ignorância da nossa parte esperar que nós mesmo e nossas práticas nos comportemos todos os dias da mesma maneira. É justamente por se renovar todos os dias que a prática nos traz elementos novos para refletirmos.

Talvez, essas aividades não sejam adequadas para você. Se bondade-amorosa não está aumentando sua compaixão, tente outra coisa, tipo escrever sobre uma ocasião em que tenha se sentido o destinatário da compaixão de alguém, ou mesmo algum momento em que tenha sentido compaixão espontânea por outro. É importante também estar aberto à outra possibilidade: talvez práticas de compaixão não sejam o que você está precisando agora. A boa notícia é que existe uma grande variedade de práticas contemplativas que podem te ajudar a tornar-se mais presente e menos preso em julgamentos e percepções parciais.

Leva tempo para desenvolver novos hábitos. Seja paciente e continue tentando. Um dia, você poderá se perceber mais bem preparado para enxergar o sofrimento e lidar com ele de forma mais eficaz.

Artigo original em inglês publicado por upliftconnect.com  https://upliftconnect.com/six-habits-of-highly-compassionate-people/?utm_source=facebook&utm_medium=link&utm_campaign=uplift

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